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Na hora de lançar um livro, somos seis!


Em agosto, mês em que celebro o meu quadragésimo aniversário, será lançada a obra poética Terceira (és) Ilha, Mulher Poesia, escrita a seis mãos. 

Ao oitavo dia do mês oito, a coletânea que juntou 6 mulheres nascidas na ilha de Jesus Cristo verá a luz do dia pela primeira vez. Trata-se de um livro de poesia que alberga no seu interior vários mundos recônditos cheios de sensibilidade: o amor, a felicidade, a ilha mãe, a mulher… Carina Fortuna, Carla Félix, Catarina Valadão e Lurdes Branco juntamente comigo aceitamos o repto de Sandra Fernandes e resolvemos embarcar na mesma aventura. Certamente, para cada uma de nós não será a primeira vez porém, arrisco a generalizar que será a mais especial. O dia do seu lançamento perdurará, indubitavelmente, na memória das suas autoras por muitos e bons anos e sempre que folhearmos este livro, vida fora, seremos sempre seis. Gratidão!

 

Vontade desmedida (fictício)



Mais um dia, porventura chuvoso, depois de naquela semana o ambiente ter aquecido. Tinhas o namorado à espera vezes sem conta, cedias-lhe tudo, até os teus sentimentos mais fortuitos, a tua casa e como seria de esperar, os teus atos em seu abono.
Essa semana adivinhou-se, estranhamente, agradável. Um dia inteiro na tua companhia era deveras paradisíaco, embora se tornasse curto pela importância que, mutuamente, nos aprazava. 
Aquele toque entre lábios, há dias, enquanto preparávamos juntas um jantar delicioso, teria sido satisfatório, iluminou-me a noite, mas saberíamos de antemão que não seria suficiente. 
  
 - Ainda bem que apareceste. Tenho sonhado contigo acordada, contei os dias para te ver. Foram longos, pareceram muitos. - Disse eu com voz trémula. 

O Ricardo era um homem maravilhoso também tinha de mim todos os caprichos. Era o meu melhor amigo, conseguia decifrar todas as tristezas do mundo no meu sorriso mais rasgado, também por isso me conquistou. Era o companheiro ideal, além disso, na cama era louco, o macho viril que domina, que conhece todas as técnicas da arte de dar prazer a uma mulher. Confirmo: o sexo oral era exímio,  era um namorado de sonho. Porém, hoje decidi dar lhe uma trégua. 

Passar o dia contigo, esperando que aquele beijo suave se expanda, que provoque um voejo em minha alma. 
No fundo, queria te conhecer mais e mais e mais. Já conhecia tanto de ti, mas todos os dias, temos um pouco de "eu" em nós, influenciado pelas pessoas com quem convivemos, pelas atitudes que nos demonstram e pelos lugares por onde passamos até quando só queremos a nossa própria companhia, somos mesmo alguém novo todos os dias. 

- O ser humano é incoerente e imprevisível, sabias? O que fomos ontem duvidou do que somos hoje. Somos um constante "aprender que já estivemos errados".  - Disse eu, movida pelo lado inspirado que me é apanágio, há anos desde que consigo ter em meu redor um ambiente inspirador.

- Não duvido! - Respondeste - Acho que somos iguais, sentimos o mesmo, queremos o mesmo, cometemos os mesmos erros... 

Cerrei-te os lábios com os dedos, não precisava de mais palavras, queria-te a ti. 
Sentir a textura de teus lábios com as minhas impressões digitais, provocou em mim os mais sórdidos arrepios no fundo da barriga e na ânsia de receber o tão famigerado sinal, sentia a urgência rebelde da aparição de borboletas esvoaçando a parte interna de todo o meu corpo. Não resistimos, o dia foi tão curto e infinito na sua plenitude. Despimo-nos de preconceito, de medo, de barreiras mentais e só depois de roupa. Lembro-me, elogiaste a maciez dos meus lençóis. O teu tecido preferido contrastava com as nossas peles juntas. Não era a cor, não era a textura, no fundo nada era igual na realidade, mas sentíamos que no nosso mundo secreto, tudo podia ganhar a forma que quiséssemos, até um simples lençol rosa cetinoso, no nosso imaginário podia ter a cor da nossa pele. O nosso íntimo era um mundo à parte só nosso e nada nos podia deter. Eras a combinação perfeita entre o querer e o ter e só me ocorria dizer-te: " Deixa-me ficar em ti, por muito tempo. " 

- Gosto quando me olhas com o teu silêncio, nunca sei o que estás a pensar. - Sussurraste paulatinamente. 

Prontamente, respondi: - Sabes, os tumultos estão todos cá dentro, é por isso que o meu silêncio olha-te... 

Desci o teu corpo quente com os meus labios e focando-me em teu sexo, implorei sem palavras pelo teu orgasmo, apenas com um ósculo ardente entre quatro lábios diferentes. Expandiu-se assim o beijo com um auge majestoso, cheio de suspiros e gemidos. Senti-os como fogo de artifício em nosso redor. Estávamos a celebrar um sentimento que achávamos que ninguém conhecia, que era inédito e que era só nosso. Abraçamo-nos como se o amanhã não viesse, como se fosse uma jura não verbalizada de que a aquela loucura, era amor. 

- Amo-te! - Arrisco sempre
- ‎Não sabes - entristeceste-me... 
- Duvidas, que é amor? - Questionei!
- ‎Não duvido, sinto o mesmo. - Declaraste-te! 

Sentíamos o amor vindo de outras direções. Éramos amadas e bajuladas por pessoas do sexo oposto, tínhamos amor, carinho, amizade. Nada nos faltava. Mas sobretudo tínhamos uma na outra o que só uma mulher nos podia dar. 
Ganhei a certeza que podemos ser felizes em mundos paralelos com mais borboletas do que gente. Borboletas julgam menos... 

Vallda

Vallda: Pedir o divórcio é um ato de amor (próprio)

A eternidade tem sempre um custo. Há paixões tão intensas que nos levam a desejar que a relação dure e perdure no tempo. Imagina-se um "Para sempre" feliz como as histórias de muitos dos nossos pais e avós que viveram juntos até ao fim dos seus dias mas que viveram, muitos deles relações irregulares recheadas de episódios de violência física ou psicológica, testemunhadas por quem, vai vivendo com o mesmo intuito de contrair matrimonio, convencido que consigo, será diferente!
O casamento é a etapa que nos cega. Quase, de forma insconsciente, consideramos que assinar um contrato conjugal vai nos trazer a felicidade plena quando no fundo não é mais que um vínculo que nos faz parecer bem perante família e amigos ou um negócio civil que enche, de certo modo, os bolsos ao estado: Pagamos para casar, pagamos para divorciar! 
Atualmente, juntar os "trapinhos" e viver em união de facto não é ( ainda ) bem visto. 
O amor, por vezes é um negócio. Partilha-se casa, carro, contas bancárias, etc! Vive-se junto, estraga-se uma só casa mas no fim, ganha-se por direito, os bens do cônjuge. E o amor? 
Sim, porque um amor como o de " The Titanic, é só para quem morre jovem, caso contrário, também mete àgua! Ninguém ama para sempre, habituam-se! E o único amor eterno será, pelos filhos!
Por isso, que o dia do divórcio, seja sempre como o dia do casamento, de cabeça erguida para a nova vida, para o novo amor ( o próprio ). Amemo-nos!

Vallda

"Mulheres como... Nós!!!"

A Queda do Véu, de Maura Sarmento Fernandes

Em mim, quase desde sempre, houve uma pretensa ambição de procurar nos livros físicos alguma sabedoria que, porventura, tivesse sido rompida na escola instituição, ou não fosse eu uma acérrima leitora de compêndios que adaptam-se, com facilidade, aos meus interesses. Depois de anos, presa a todo o tipo de livro que não o de poesia, literatura essa que, desde os meus 9 anos de idade abunda pelas minhas opções de escrita, finalmente, enveredei pelas lides poéticas também na leitura. 
2018, ano da descoberta, desencadeou o processo e revelou-se, a nível pessoal como o ano da poesia. Depois de alguns livros lidos de autores locais que muito estimo, com conteúdos aprazíveis, ora pela qualidade poética ora pelo vínculo pessoal, eis que em 2019, já no seu desfecho, descubro também nas plataformas digitais uma autora a que não consegui ficar indiferente. 
Maura Sarmento Fernandes, poetisa Mariense a residir na ilha de São Miguel, Açores, arquipélago que também meu, tem dado largos passos na arte da Poesia e é berço de poetas de renome, como Natália Correia e Vitorino Nemésio. 
Maura Sarmento Fernandes que na infância, também, ganha o gosto pela escrita, edita e apresenta ao seu público o primeiro livro, em maio de 2019. A Queda do Véu, cai na minha prateleira preferida como uma luva, uma lufada de ar fresco ou uma chamada de atenção. -Tenho textos na gaveta que nunca viram a luz do dia! Viver numa ilha delimita! No fundo, o meu estigma é contra a mentalidade fechada de quem lê poesia. - A ousadia, a sensualidade o semi-erotismo e a frontalidade são exponentes máximos neste livro onde a linguagem é simples e acessível.
Livro sem prólogo, sem índice, de títulos sublinhados, excesso de reticências, biografia demasiado sintetizada e pormenores que a autora achou desnecessários por ser desprendida de regras e protocolos literários, debruça-se, unicamente, sobre a partilha dos seus "escritos",  como vulga.  
Da queda do véu, destaco Mulheres como... nós!!! Entre tantos que eu, como leitora e mulher, degustei e fiquei saciada. 

"Ser doce em tudo o que tocas"

"Viva o açúcar do coração!"

Entrei, li... 
li as minhas histórias, a minha vida, identifiquei-me... Fechei o livro e desejei que o meu véu também caisse. Obrigada Maura Sarmento Fernandes!

Vallda

Vallda: Tolices que me valeram ouro

Se eu pudesse retornar atrás no tempo, retornava, só para confirmar aquilo que eu própria já presenciei, fotografava mais e guardava mais em vez de deitar fora as evidências.
Há dias, à conversa com um amigo de longa data, por sinal, influente, astuto e popular no meio onde vivemos, não sei se por feitio, se pela força do hábito de reclamar, se levado pela rebeldia dos seus 60 anos ou simplesmente coagido pela ingestão de algumas cervejas, notei no seu tom de voz a agressividade da crítica:

 - "Aquele jornal está fraquinho!"

 E eu, com a complacência de pessoa calma, reservada, silenciosa, mas frontal, por outras palavras respondi, respeitosamente.

  - Sabe, em 1999 apresentei o dito jornal à minha família. O meu pai foi assinante até um ano após a sua morte. Durante 19 anos li e reli grande parte das edições. No inicio, e porque a idade era a de me deliciar com coisas novas, da novidade e da imaturidade tive o prazer de ver dois poemas da minha autoria lá estampados. Eu ainda era uma adolescente. Infelizmente não tenho nenhuma edição desse tempo. A vida deu-me uma rotina de caracol, e por carregar, várias vezes a casa às costas, fui perdendo essas recordações, que por já não as ter, fico-me apenas por uma vaga ideia. Lembro-me, entretanto que em 2015 o Jornal me "chamara" para desempenhar funções de colaboradora permanente, oportunidade essa que podia ter sido desperdiçada, quando me pedem para eu identificar cada poema com uma fotografia minha, nessa altura, a minha recusa até foi bem aceite só nunca entendi o porquê da utilização da minha imagem de perfil do Facebook onde apenas se destacava a letra V. Não ficava bem. Nunca reclamei, mas confesso a minha dificuldade em entender tal atitude. Fui publicando, sentia-me sozinha e nem sabia se alguém me lia, não havia feedback. Até à equipa do jornal ser renovada e eu ser dispensada. Eu sabia que não era para sempre. O dito pasquim, continuava sempre em mudança até que em 2018 " chamam" por mim, outra vez. Queriam fazer-me perguntas, queriam fotografar-me e porventura, voltariam a aceitar os meus poemas. A Vallda estaria de volta, mas desta vez com rosto. E continuo a achar que não é para sempre...
Já sem assinatura, o jornal às vezes  vem cá ter. Conheço-o. Eu conheço o jornal dos últimos 20 anos. Se ele está fraquinho é porque se calhar era forte em datas anteriores a 99. Não vi, não li, e não tenho bases para poder argumentar.
Serei só eu a achar que o Jornal evoluiu? Será que as pessoas não gostam de poesia ou será que a função informativa é que não é satisfatória?

Ah, lembrei, o senhor que me fizera tal afirmação foi o mesmo que há uns tempos olhos nos olhos terá questionado, a minha pessoa:

-"Nunca mais escreveste umas "tolices" para o jornal?"

  Eu sorri por fora...Por dentro, iria esquecer, numa questão de horas...

Levo muito a serio o que escrevo, o que publico e igualmente o que penso.
E penso que o jornal da Praia, sim o quinzenal, está no seu melhor, pelo menos desde 1999, com as minhas tolices ou sem elas...

Vallda

Vallda: Incrivelmente, Maria!


        Parece feliz! Maria, tem um vício bom de lembrar desejos antigos no vagar do tempo e no platonismo dos sonhos, porque sempre acreditou que, um dia, todas as coisas mudam de cor, que a chuva apazigua e que há uma égide paradisíaca no arco-íris!
         O seu maior sonho é, indubitavelmente, perdoar o agressor. Incrivelmente, pensa assim porque o timing de concretização de um sonho nunca é efêmero. Perdoar é uma lufada de ar fresco que carece de tempo!
         Num passado recente, ela já tinha sido guerreira, já tinha quebrado muros, derrubado as fronteiras do medo e conquistado coisas inimagináveis! Toda uma história bonita que não foi construída da noite para o dia, pois, truques de magia são fictícios, são pura ilusão.
         Hoje as pessoas, sempre que a encontram, olham-na de cima a baixo ou de lado, mas com olhos de admiração. A metamorfose é visível, porém, ninguém, sequer, imagina que no âmago, como se fosse uma ilha, verte-lhe sangue por todos os lados.
        Ela ama tanto a liberdade da sua solidão naquela fase do dia, em que estar sozinha é estar em paz, degustando uma hora de cada vez.  O problema é que à parte, co-habitam, com a sua vontade de voar plenamente, vozes que, sobre ela, exercem uma supremacia corrupta, ora pela intenção, ora pela violência do tom, que mutilam como lâminas dilacerantes a sua essência e colocando a um canto todas as suas histórias memoráveis de glória e superação, vozes que sangram! Contudo, ela abomina o rótulo. Ser rotulada de vítima é um estigma que  não lhe dá o estatuto que ela diz ter, o de uma mulher de armas! Esta é a condição ideal de uma mulher sofredora que jamais aceita ser, realmente, a vítima! Aliás, até pode doer, mas para ela, aquele ser falante e insensível, é a única vitima de si mesmo e de uma formação insuficiente ou negligente! E é desta forma que ela decreta e assume um paradigma de heroína de si própria. Dona do seu nariz, julga já ser aquilo que bem lhe apetece! Parece, realmente, feliz! É assim que Maria vive, desde há muito, uma vida igual à de tantas outras Marias, mas, incrivelmente, envolta num gracioso eufemismo e de cabeça erguida à espera que um sonho se materialize, mas, sem que quase ninguém lhe conheça a alma.
          Diz ela, que um dia, até isto mudará de cor! No fundo, Maria sabe que ganhará uma vida inteira quando decidir embutir nela um arco-íris!  Até lá, escutando e sangrando!

Vallda